Após vários projetos locais, finalmente tive a coragem de aceitar fazer um intercambio. Duas semanas, apenas duas semanas, não tinha como correr mal! Pois bem, não correu, foi na realidade uma das experiências mais interessantes que eu alguma vez tive, e em grupo. Era confortante o facto de ir com um grupo português porque confesso que esse foi sempre o meu receio, estar sozinha num país onde tudo me era desconhecido. Spoiler alert: acho que superei esse medo e estou pronta para o próximo.
Chegamos a Ozurgeti domingo de madrugada e depois de todo o cansaço que houve com as devidas três escalas e um voo atrasado chegamos finalmente à nossa casa temporária pelas próximas duas semanas. Choque total foi a minha reação ao chegar à casa e perceber que ia dormir numa cama do tempo da União Soviética, que ia ficar sem água da meia-noite até às oito da manhã (e por vezes muito mais do que esse tempo, mal nós sabíamos), sem internet até à tarde seguinte, uma cozinha antiguíssima, uma casa de banho para 8 raparigas. A minha casa de banho muitas vezes ia ter que ser a rua, pois o meu quarto era no piso de baixo e para ir para a parte de cima, onde se encontrava a cozinha e a casa de banho, tinha que subir as escadas desabrigadas a meio da noite (medo instantâneo). Contudo, pensei “eu sou romena, consigo sobreviver a isto” e o choque deixou de ser tanto, não que ser romena seja uma qualidade de sobrevivência, mas a Geórgia era relativamente parecida com a Roménia, e principalmente com as casas dos meus avós em certos aspetos. Confesso que os primeiros dias naquela cama foram estranhos pois a cada movimento que eu fazia ela afundava-se imenso, mas para minha felicidade e das minhas companheiras de quarto deixou de ser um problema e até foi muitas vezes apreciada e desejada.
Depois de nos termos habituado à nossa querida mansão, começamos a conhecer a realidade que ia ser a nossa, nas próximas semanas. Ozurgeti, uma pequena cidade de Guria com pessoas maravilhosas (que por sinal não falavam inglês, mas conseguiram chegar até ao meu coração), repleta de caninos afetivos, tranquila e acolhedora. As pessoas conheciam-se todas entre elas e os olhares de curiosidade perseguiam-nos quando íamos às compras, passeávamos ou comíamos fora. Não eram olhares maldosos e sentia-se completamente, assim que estávamos à vontade soltávamos um “gamarjobat” (olá) e era nos dado uma resposta semelhante, bem como um sorriso reconfortante. A realidade não diferiu muito das minhas expetativas, tinha alguns restaurantes locais, lojas de roupa em segunda mão, imensas farmácias, supermercados e uma das minhas partes preferidas, um mercado aberto, mais como uma feirinha local que tinha de tudo, entre roupa a preços mega acessíveis, comida fresca a imitações baratas bastante realistas.
Não foi difícil habituarmo-nos com a cidade, ao fim de uns dias, depois da tour feita pelos voluntários georgianos, estávamos em casa. Já com a comida não posso dizer o mesmo, THEY LOVE SPICY FOOD, o que para meu azar, não é o meu forte. Porém, não vou menosprezar as partes boas da culinária georgiana e vou vangloriar os khinkali (pasteis de massa cozidos que podem conter, carne ou cogumelos e que se come de uma forma incrivelmente original), Lobiani (pão normalmente recheado com feijão, mas adorava os com cogumelos), o meu favorito Khachapuri (um pastel recheado com queijo e no topo contém ovo e manteiga, delicioso) e não pode faltar os meus queridos ponchiki (uns belos donuts georgianos receados com doce). Uma culinária totalmente diferente do que estava à espera, pois na verdade, pensava que iria ter algumas parecenças com a culinária romena, mas estas eram mínimas mesmo e, no entanto, deixaram a desejar por mais.
Passamos uns dias na capital, Tbilisi, fizemos uma viagem de 5 horas de marshrutka (oficialmente traduzido é “táxi de rota”, mas é na verdade uma van compartilhada na qual tem uma rota definida e só parte quando todos os acentos estiverem ocupados) com bastante adrenalina, o condutor claramente era experiente naquilo, percebia-se pelo excesso de velocidade, ultrapassagens e curvas estreitas muito bem feitas. Se vomitei? Estava quase, mas sobrevivi.
A capital foi um imenso contraste para nós, vindas de uma pequena cidade, esta cidade não dormia, e já uma grande quantidade de pessoas falava inglês, e havia fast food, e shoppings, e preços altos, e transito. Era um belo caos, por assim dizer. Aproveitei o máximo que pude, visitei o máximo de pontos turísticos e as fotos para o Instagram não podiam faltar. Ao final de um dia e meio, as saudades de Ozurgeti já apertavam e já era hora de partir. Ninguém vai acreditar na felicidade que foi quando chegamos à estação das carrinhas e o senhor responsável pela nossa viagem disse que íamos fazer a viagem sozinhas, tínhamos a van só para nós e foi a coisa mais empolgante da viagem pois podíamos estar completamente sentadas e deitadas a vontade, e pelo que pareceu o condutor adorou a playlist da nossa DJ.
Assim se passou uma semana, na segunda semana começamos com o voluntariado no orfanato local. Conhecemos as crianças naquela acolhedora casa e todas elas foram recetoras com a nossa chegada, nos dias seguintes receberam-nos de braços abertos e de sorrisos no rosto. Estava preocupada que a linguagem fosse um obstáculo muito grande e que nos impedisse de criar laços com eles, mas por sorte do destino correu mesmo muito bem, alguns deles sabiam um pouco de inglês e a maioria das vezes, tínhamos os voluntários georgianos connosco. Entre jogos como o Uno e o Monopoly, danças e jogos de vólei, não só passamos momentos incríveis, mas conseguimos também proporcionar alegria aqueles meninos georgianos. Tive imensa pena de não ter ficado mais tempo com eles, pois confesso que me cheguei a apegar e gostaria mesmo de lhes ter proporcionado mais tempo de qualidade.
Os dias finais do nosso projeto chegaram e uma surpresa estava para vir: Bakhmaro, uma vila na montanha de Chokhatauri Guria. Posso dizer que depois do gelo que estava e do caminho cheio de curvas que passamos para lá chegarmos, compensou totalmente, atrevo-me a dizer que foi um dos melhores dias que passei na Geórgia. A nossa amiga voluntaria apresentou-nos o local ao detalhe, e pudemos ter uma experiência de chorar por mais, o ar tao puro, a água do rio tão clara, limpa e gelada (atrevi-me a molhar os pés), as casas rurais, os animais a pastarem livremente, tinha totalmente uma beleza natural que era de admirar.
E chegou assim o final do meu primeiro projeto fora. “Uau” foi a minha reação quando acabou, passou a correr, mas confesso que tinha saudades das condições básicas de eletricidade e dos cozinhados da minha mãe. Vou levar para sempre esta experiência no meu coração, as pessoas com quem fui, as pessoas georgianas (principalmente as queridas idosas que nos perguntavam sempre de onde eramos e nos desejavam sempre o melhor e os vizinhos que faziam sempre questão de nos convidar para jantar em casa deles), todos os cãezinhos que vi na rua e que me contive para não os levar para casa (ou alimentar), das voluntarias georgianas, principalmente da Tamo, que criei uma grande conexão e espero ver em breve, das crianças que consegui arrancar um sorriso por passar um tempo genuíno com elas e acima de tudo vou levar uma parte de mim que não conhecia antes desta jornada.
Conselho de amiga: se tiverem uma oportunidade como esta, não a percam!